domingo, 12 de maio de 2013

Geoconservação

A conservação da natureza geralmente tem como foco principal a conservação da biodiversidade, porém, cabe lembrar que a biodiversidade é dependente da geodiversidade e por isso, para que a conservação da natureza seja bem sucedida é preciso integrar a bioconservação com a geoconservação (Sharples, 2002).
 A maior parte das ameaças à geodiversidade, assim como ocorre com a biodiversidade, está relacionada às atividades humanas, direta ou indiretamente, de forma que o desafio é alcançar o equilíbrio entre o uso e a conservação da geodiversidade. Entre essas ameaças, destacam-se: as atividades de exploração de recursos minerais; desenvolvimento de obras e estruturas; gestão das bacias hidrográficas; agricultura, florestação e desmatamento; atividades militares; atividades turísticas e recreativas; e a falta de conhecimento técnico e cientifico ao identificar e gerir áreas de interesse para a conservação (Brilha, 2005).
 
A geoconservação pode ser definida como as ações tomadas para conservar e melhorar as características geológicas e geomorfológicas, processos, sites e espécimes (Burek & Prosser, 2008). Dessa forma, a geoconservação reconhece a importância dos componentes não vivos do ambiente natural para a conservação da natureza, sinalizando a necessidade de uma gestão adequada para esses recursos (Sharples, 2002). Entretanto cabe compreender que o foco da geoconservação ultrapassa a proteção de funcionalidades aos seres humanos e inclui o objetivo de manter os processos ecológicos naturais, cuja abordagem está centrada em evitar ou minimizar a degradação de forma a proteger os valores naturais e intrínsecos dos recursos, não apenas os valores utilitários (Sharples, 2002).
 
O objetivo da geoconservação consiste na conservação e gestão do patrimônio geológico e dos processos naturais a ele associados (Pereira, Brilha & Pereira, 2008; Brilha, 2005). De acordo com Sharples (2002), o objetivo é de manter significativos exemplos representativos da geodiversidade, cuja manutenção dos processos naturais ocorra de forma a manter a sua capacidade de mudar e evoluir de forma natural (taxas naturais e magnitudes de mudança).
 
A plena integração da geodiversidade em amplos programas de conservação da natureza é premissa para a conservação dos valores e da sustentabilidade dos ambientes naturais (Sharples, 2002). De acordo com Burek & Prosser (2008), são exemplos de geoconservação as ações realizadas com o intuito de conservar, como uso de políticas e legislação relacionadas à conservação, ações voltadas ao aumento da consciência para gerar apoio, gestão local e auditorias de conservação. Ainda, ressalta que é vital reconhecer as contribuições locais nas origens da geoconservação. Outras questões, abordadas por Pereira, Brilha & Pereira (2008), é que os planos de ordenamento de território devem considerar cada vez mais os locais com valor geológico como potenciais recursos a promover e a necessidade de que cada cidadão defenda a integridade do patrimônio geológico, ou seja, do conjunto de geossítios inventariados e caracterizados numa dada área. Segundo Brilha (2005), a necessidade de conservar um geossítio é igual à soma do seu valor mais as ameaças que o mesmo enfrenta.
 
De acordo com Gray (2005), os diferentes elementos da geodiversidade precisam ser protegidos e gerenciados de diferentes maneiras, reforça que a geodiversidade deve ser respeitada dentro e fora das áreas protegidas e cita algumas abordagens para a geoconservação: conter fisicamente a aproximação de visitantes aos locais sensíveis; comprar locais com o objetivo de manter o seu valor de conservação da natureza; criação de área protegida com legislação específica; educação e documentação cientifica; elaborar, implementar e atualizar o plano de gestão da conservação, entre outros.
 
Referências Bibliográficas:
Brilha J 2005, Patrimônio Geológico e Conservação: A Conservação da Natureza na sua Vertente Geológica, Braga, 190p.
 
Burek C V & Prosser C D (eds) 2008, The History of Geoconservation, Geological Society, London, Special Publications, 300, 1–5.
 
Gray M 2005, Geodiversity and Geoconservation: What, Why, and How?  The George Wright Forum, Vol. 22, N° 03, pp.04-12.
 
Pereira D, Brilha J & Pereira P 2008, Geodiversidade – Valore e Usos, Universidade do Minho, Braga.
 
Sharples C 2002, Concepts and principles of geoconservation, Versão 3, Tasmanian Parks & Wildlife Service website.

 

 

 

terça-feira, 7 de maio de 2013

Geodiversidade - conceito e valores

O conceito de Geodiversidade é bastante recente: foi utilizado pela primeira vez em 1993 e é equivalente ao conceito de biodiversidade (Gray, 2008). Ainda que haja interpretações diferentes, cabe destacar a definição proposta por Roy of Society for Nature Conservation do Reino Unido: “A geodiversidade consiste na variedade de ambientes geológicos, fenômenos e processos ativos que dão origem a paisagens, rochas, minerais, fósseis, solos e outros depósitos superficiais que são o suporte para a vida na Terra” (Brilha, 2005).

De acordo com CNU (2007), os geocientistas entendem que são os processos bióticos e abióticos que sustentam a evolução da vida. Santucci (2005) ressalta a importância que existe entre esses processos (e recursos) e afirma que há uma relação intrínseca entre ambos. As paisagens, as formas de relevo e os materiais proporcionam diferentes habitats com biodiversidade, e a biodiversidade do nosso planeta é em grande parte devido à diversidade do mundo geológico (Gray, 2005). Neste sentido, ao comparar diversos países, Pereira, Brilha & Pereira (2008) observaram que aqueles onde há elevada geodiversidade há também maior biodiversidade, concluindo que tanto a distribuição como a sobrevivência das espécies depende das condições físicas e químicas do ambiente que ocupam. Dessa forma, entende-se que as rochas constituem o substrato essencial para o desenvolvimento de uma variedade de seres vivos (Pereira D, Brilha J & Pereira P, 2008), sendo que o solo é o elo entre os mundos bióticos e abióticos e a ponte perfeita entre geodiversidade e biodiversidade (Santucci, 2005 e Brilha, 2005).
 
José Brilha (2005) afirma que a geodiversidade condiciona a biodiversidade e dá condições de sobrevivência às espécies. CNU (2007) explica que cinco das grandes extinções em massa e outras dez de menor dimensão que ocorreram durante a história da vida podem ser explicadas, de um modo geral, como resultado de alterações ambientais como: as alterações climáticas, o movimento das placas tectônicas, o vulcanismo a nível mundial, as variações no nível do mar, as alterações nos ciclos biogeoquímicos e cataclismos cíclicos por grandes asteroides ou cometas. Da mesma forma que a geodiversidade está intrinsecamente ligada à biodiversidade, também está relacionada à evolução da civilização. Ao longo do tempo, a humanidade dependeu (e ainda depende) de recursos geológicos: houve a Idade da Pedra, do Cobre, do Bronze, do Ferro, dependência das reservas de carvão durante a Revolução Industrial, dos combustíveis fósseis durante o século XX, e do silício, usado na composição de todos os dispositivos eletrônicos que as sociedades e pessoas utilizam atualmente (Pereira, Brilha & Pereira, 2008).

Quanto aos valores da geodiversidade, mais de 30 podem ser reconhecidos e classificados em cultural, estético, intrínseco, econômico, funcional e científico (Gray, 2008 apud Gray 2004). Já na visão de Sharples (2002), há três tipos básicos de valores: intrínseco, ecológico e humano.
 
O Valor Intrínseco, ou da existência, é aquele que reconhece o valor em si, independente da funcionalidade ao ser humano, extrapolando as preocupações éticas para além dos seres humanos e demais seres vivos. O Valor Ecológico configura-se na importância de algo ou processo na manutenção dos sistemas naturais e processos ecológicos. O Valor Humano (ou antropocêntrico) implica nos valores diretos aos seres humanos (Sharples, 2002). Por exemplo: comercialização de pedras preciosas, exploração de minerais, pesquisa científica e educação, locais inspiradores e “sagrados”, turismo, recreação, relação com a cultura, entre outros.
 
Para finalizar, cabe destacar que a maioria dos recursos que integram a geodiversidade são não renováveis e considerar a importância e a relação entre os componentes vivos e não vivos do nosso planeta podem ajudar a promover uma abordagem mais holística para a conservação da natureza (Gray, 2005).

 Referências Bibliográficas
Brilha J 2005, Patrimônio Geológico e Conservação: A Conservação da Natureza na sua Vertente Geológica, Braga, 190p.

Comissão Nacional da UNESCO (CNU) 2007, Terra e Vida - as origens da biodiversidade, Ciências da Terra para a Sociedade, Prospecto relativo a um tema - chave do Ano Internacional do Planeta Terra 2007 - 2009.

Gray M 2005, Geodiversity and Geoconservation: What, Why, and How?  The George Wright Forum, Vol. 22, N° 03, pp.04-12.

Gray M 2008, Geodiversity: developing the paradigm, Proceedings of the Geologists' Association, Vol. 119, Issues 3-4, pp. 287-298.

Pereira D, Brilha J & Pereira P 2008, Geodiversidade – Valore e Usos, Universidade do Minho, Braga.

Santucci V L  2005, Historical Perspectives on Biodiversity and Geodiversity The George Wright Forum, Vol. 22, N° 03, pp.29-34.

Sharples C 2002, Concepts and principles of geoconservation, Versão 3, Tasmanian Parks & Wildlife Service website.

 

 

quinta-feira, 18 de abril de 2013

Breve abordagem sobre conservação da biodiversidade


Estudos sinalizam que, em um futuro próximo, a maioria das causas que ameaçam a biodiversidade tendem aumentar ou a permanecer constantes ao invés de serem reduzidas. Dessa forma, torna-se cada vez mais necessário adotar medidas e implementar ações que visem a conservação da biodiversidade, onde os governos, organizações não governamentais, empresas privadas e comunidades se comprometam tanto a mitigar a perda da biodiversidade como  a apoiar o seu uso sustentável. Millennium (2005) ressalta ainda que os programas de gestão de recursos naturais que envolvem as comunidades, considerando seus saberes e envolvimento, ajudam a retardar a perda de biodiversidade e trazem benefícios diretos para as pessoas. Por outro lado, sinaliza que ações que garantem que as comunidades locais se beneficiem a partir de um ou mais produtos da biodiversidade foram mais bem sucedidas quando houve incentivo na inclusão dessas comunidades nas tomadas de decisão relacionadas à gestão da área, tornando essencial tanto a disponibilização de informação como o fomento à participação.
Há uma grande variedade de estratégias, programas, ações e comportamentos que podem ser adotados em prol da conservação da biodiversidade, como o incentivo à pesquisa, a aplicação de recursos financeiros, a legislação específica, a fiscalização eficiente, o consumo responsável, os acordos internacionais, os incentivos fiscais (ICMS ecológico, por exemplo), o fomento à participação nas tomadas de decisão, a realização de programas de educação e comunicação voltados à conservação, entre muitos outros (Millennium, 2005). Essas medidas são implementadas de acordo com dois tipos de abordagem: a baseada em habitat e as baseadas em espécie, sendo que essa última não é suficiente para a conservação do habitat.

Uma das estratégias para a conservação da biodiversidade, cuja abordagem é baseada em habitat, consiste na criação de áreas protegidas, cuja gestão deve ser voltada à sustentabilidade. Porém, Millennium (2005) adverte que o atual sistema de áreas protegidas não é suficiente para a conservação, pois as áreas precisam ser melhor localizadas e projetadas, além de ser necessário lidar com problemas como a falta de representatividade, os impactos da ocupação e das atividades  humanas dentro dessas áreas, o turismo realizado de forma insustentável, os impactos causados por espécies invasoras etc.

A Lei n° 9.985 de 18 de julho de 2000 institui o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC), constituído pelo conjunto das unidades de conservação federais, estaduais e municipais, tem entre seus objetivos: contribuir para a manutenção da diversidade biológica e dos recursos genéticos no território nacional e nas águas jurisdicionais; proteger as espécies ameaçadas de extinção no âmbito regional e nacional; contribuir para a preservação e a restauração da diversidade de ecossistemas naturais; promover o desenvolvimento sustentável a partir dos recursos naturais; recuperar ou restaurar ecossistemas degradados; e valorizar econômica e socialmente a diversidade biológica. As unidades de conservação estão divididas em dois grupos, a saber: unidades de proteção integral, cujo objetivo central é preservar a natureza; e as unidades de uso sustentável, que visam compatibilizar a conservação da natureza com o uso sustentável dos seus recursos (CCivil, 2000).
Quanto ao ambiente marinho, Amaral & Jablonski  (2005) ressaltam que as unidades de conservação não são suficientes em relação à quantidade e a extensão e em alguns casos ainda não tiveram seus respectivos planos de manejo elaborados ou implementados. Outro ponto que destaca é a precariedde da gestão pesqueira, onde ainda há baixa participação das comunidades envolvidas diretamente com essa atividade.

Em 1999, os participantes de um workshop realizado no Brasil traçaram algumas recomendações relacionadas à conservação da biodiversidade marinha: intensificar os estudos sobre o habitat artificial e suas implicações ao ambiente marinho, intensificar as pesquisas (levantamentos, avaliação de estoques, estudos oceanográficos), identificar novos recursos pesqueiros e e stoques e introduzir técnicas apropriadas para a redução da captura de fauna acompanhante, intensificar as ações e programas de educação ambiental, combater a pesca excessiva realizada pela atividade industrial e artesanal pesqueira (Amaral & Jablonski, 2005).
A exclusão dos indicadores de produção de pescado marítimo e continental da publicação que apresenta os indicadores de desenvolvimento sustentável do Brasil (IBGE, 2012) reflete a insuficiência de pesquisas nesta área, especialmente sobre a capacidade biológica relacionada aos estoques pesqueiros. Tal fato certamente compromete o acerto na definição de estratégias e medidas para a redução da perda da biodiversidade.

Após essa breve abordagem sobre as medidas de conservação da biodiversidade, conclui-se que muitos são os desafios a serem enfrentados e embora já haja um esforço a favor da redução da biodiversidade, ainda há muito onde avançar, tanto globalmente, como a nível nacional e para tanto, é preciso o real comprometimento de todos (pessoas, empresas, entidades, instituições e governos) com a sustentabilidade.

 
Amaral A C & Jablonski S 2005, Conservação da biodiversidade marinha e costeira no Brasil, Megadiversidade, vol. 1, n°1, pp. 43-51.

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) 2012, Indicadores de Desenvolvimento Sustentável Brasil 2012, acessado em 09 de abril de 2013, http://g1.globo.com/natureza/rio20/noticia/2012/06/uso-de-fertilizante-no-brasil-mais-que-dobra-em-8-anos-diz-ibge.html

Millennium Ecosystem Assessment 2005, pp. 1-41. In Ecosystems and Human Well-being: Biodiversity Synthesis. World Resources Institute, Washington, D.C.
 
Presidência da República Casa Civil Subchefia para Assuntos Jurídicos (CCivil) n.d. d, Lei N. 9.985, de 18 de julho de 2000, acessado em 17 de abril de 2013, http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9985.htm

 

sexta-feira, 12 de abril de 2013

Algumas das ameaças à biodiversidade


As ações humanas que causam modificações relevantes nos habitats configuram-se como grandes ameaças à biodiversidade.

De acordo com Novacek & Clelan (2001), há consenso na comunidade científica de que a atual degradação massiva de habitat e a extinção de espécies da biota é sem precedentes e está ocorrendo em um ritmo catastroficamente acelerado. Uma estimativa alarmante é que até meados do século 21, 30% de todas as espécies podem ser exterminadas. Nos últimos 400 anos, estima-se que mais de 300 vertebrados foram extintos, sendo que atualmente cerca de 20% das espécies de mamíferos, 12% das espécies de aves e 32% das espécies de anfíbios encontram-se ameaçadas de extinção, considerando que esse aumento na taxa de perda de biodiversidade é consequencia direta da ação humana (Proença et al, 2009). No Brasil, o bioma que apresenta o maior número de espécies (flora e fauna) ameaçadas de extinção é a Mata Atlântica, seguido pelo Cerrado e Amazônia (IBGE, 2012).
Qualquer fator natural ou antropogênico que direta ou indiretamente cause uma alteração no ecossistema é considerado um promotor de alterações, cuja escala varia de acordo com a extenção e a duração do impacto. Os promotores de alterações indiretos são demográficos, econômicos, sociopolíticos, científicos e tecnológicos ou culturais e religiosos, enquanto que os promotores de alterações diretos são físicos, químicos e biológicos. Porém, a mudança atual é liderada por questões antropogênicas indiretas, sendo que nos ultimos 50 anos as atividades humanas influenciaram, com maior rapidez, nas alterações da biodiversidade, intensificando a sua perda. Entre 1950 e 2000, calcula-se que a atividade econômica global aumentou quase sete vezes, sinalizando o crescente consumo  de serviços dos ecossistemas, do consumo per capita e o crescimento da população (Millennium, 2005).

Algumas das ameaças mais importantes para a perda de biodiversidade e para as mudanças de serviços ecossistêmicos são: alterações no habitat causadas por perda de recifes de coral, modificação física de rios, mudanças no uso da terra, entre outros; as alterações climáticas; a superexploração (que muito atinge os mares e seus estoques pesqueiros); a poluição e as espécies exóticas invasoras (Millennium, 2005). Em Portugal, destacam-se as alterações ao uso do solo, a sobre-exploração de recursos, o aumento da rede viária, a poluição, a ocorrência de fogos, a introdução de espécies exóticas e o efeito das alterações climáticas a longo prazo (Proença et al, 2009). Cabe ressaltar que em Portugal, quase todos os promotores de alterações atuam em escala nacional (Domingos et al, 2009).
Em relação ao ambiente costeiro, as alterações de habitat e a poluição são consideradas as ameaças mais representativas à biodiversidade e para o ambiente marinho, a sobreexploração dos recursos. Em ambos os casos, as tendências desses impactos são de crescimento progressivo. Por exemplo, ao considerar 75% da pesca de espécies marinhas comerciais, 50% são totalmente exploradas e 25% são consideradas sobre-exploradas, a nivel mundial. Ainda em um contexto global, um grande número de espécies foram incluídas na lista vermelha das espécies ameaçadas (IUCN) devido à intensa pesca predatória (Millennium, 2005).

No cenário nacional, o Brasil segue a mesma lógica, sendo que as ameaças ao ambiente marinho estão também relacionadas ao turismo desordenado e a introdução de espécies exóticas, sendo que ambas contribuem para gerar alterações nos ecossistemas e consequentemente para a perda de biodiversidade marinha. Quanto às aguas continentais, pode-se destacar a construção de barragens e ainda, o lançamento de esgoto em corpos d´água (Amaral & Jablonski, 2005).

No Brasil, entre os principais promotores que alteram a rica biodiversidade do país destacam-se: a destruição de habitat, o desmatamento, as queimadas, a exploração madeireira, a conversão de campos em pastagens, a construção  de represas, a poluição de rios e oceanos, a chegada de espécies invasoras, a caça, a pesca predatória e o tráfico e comércio de animais e plantas silvestres (IBGE, 2012). Entre essas ameaças, a caça (para o comércio e para a subsistência) é a segunda maior ameaça à fauna brasileira (Renctas, 2001).

 De acordo com Renctas (2001), o comércio ilegal de vida silvestre (fauna, flora e produtos) movimenta entre 10 e 20 bilhões de dólares por ano em todo o mundo e a participação do Brasil representa valores entre 5 a 15% desse total. Em uma projeção estatística realizada pela Rede Nacional de Combate ao Tráfico de Animais Silvestres – Renctas chegou-se ao seguinte valor: no Brasil, 38 milhões de espécimes são retiradas da natureza por ano devido ao tráfico de animais silvestres. Ainda, é necessário ressaltar que ocorrem muitas perdas durante o processo de captura, transporte e comercialização dessas espécies sendo que para cada animal comercializado vivo, calcula-se que pelo menos 9 espécimes morreram.

Quanto ao  comércio ilegal de fauna silvestre, destacam-se quatro modalidades: para colecionadores particulares e zoológicos, cuja maior procura são justamente dos animais mais ameaçados;  biopirataria, ou seja, animais utilizados para fins científicos; a comercialização para pet shops, que se configura como a modalidade que mais incentiva o tráfico de animais silvestres no Brasil; e os produtos da fauna que são utilizados para a produção de  artesanatos, como couros, penas, garras etc (Renctas, 2001).
Diante dessa realidade, constata-se que o tráfico de animais silvestres, além de ser uma atividade ilegal e altamente destrutiva e cruel contribui diretamente para a perda da biodiversidade, pois vulnerabiliza diversas espécies da fauna silvestre brasileira, ameaçando-as de extinção.

 Aproveito para recomendar o vídeo sobre o tráfico de animais silvestres no Brasil, produzido pela Renctas e disponível em http://www.youtube.com/watch?v=YQqch56SS-E 

 

Referências Bibliográficas:

Amaral A C & Jablonski S 2005, Conservação da biodiversidade marinha e costeira no Brasil, Megadiversidade, vol. 1, n°1, pp. 43-51.

 Domingos T, Saqueira E, Magalhães M, Valada T, Vicente L, Martins H & Ferreira, M 2009, ‘Promotores de Alterações nos Ecossistemas’, in pereira M H, Domingos T, Vicente L & Proença V (eds) Ecossistemas e Bem-Estar Humano: Resultados da Avaliação para Portugal do Millennium Ecosystem Assessment, Escolar Editora, Lisboa.

Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) 2012, Indicadores de Desenvolvimento Sustentável Brasil 2012, acessado em 09 de abril de 2013, http://g1.globo.com/natureza/rio20/noticia/2012/06/uso-de-fertilizante-no-brasil-mais-que-dobra-em-8-anos-diz-ibge.html
Millennium Ecosystem Assessment 2005, pp. 1-41. In Ecosystems and Human Well-being: Biodiversity Synthesis. World Resources Institute, Washington, D.C.

Novacek M & Cleland E E 2001, The current biodiversity extinction event: Scenarios for mitigation and recovery, PNAS, vol. 98, n° 10, pp. 5466–5470.

Proença V, Queiroz C F, Araújo M & Pereira H M 2009, ‘Biodiversidade’, in pereira M H, Domingos T, Vicente L & Proença V (eds) Ecossistemas e Bem-Estar Humano: Resultados da Avaliação para Portugal do Millennium Ecosystem Assessment, Escolar Editora, Lisboa.
 
Renctas 2001, 1º Relatório Nacional sobre o Tráfico de Fauna Silvestre, acessado em 09 de abril de 2013, http://www.renctas.org.br/files/REL_RENCTAS_pt_final.pdf
 

segunda-feira, 25 de março de 2013

Qual o valor da biodiversidade?

As bananas consistem em um alimento básico para milhões de pessoas nos trópicos e estima-se que apenas na Africa Central e Ocidental, 10 milhões de toneladas de bananas sejam produzidas por ano. Quinhentos milhões de pessoas na Ásia e na África são completamente dependentes da banana como fonte principal de calorias (Jornal da Ciência, 2003). Já no Brasil, mais de 30Kg de banana são consumidos ao ano por cada brasileiro (Toda Fruta, n.d.).

Além de ser um alimento nutritivo, as bananas e bananeiras podem ser usadas também para: fazer cerveja (sumo), alimento para animais (fruta verde e seca), anti-séptico para feridas (cascas), papel (fibras), placas, guarda-chuvas, telhas e acondicionamento de alimentos (folhas), entre outras muitas utilizações (Bryant, 1997). No Reino Unido, pesquisadores buscaram uma maneira de aproveitar os restos das bananeiras, de forma a utilizar as cascas, tronco e folhas para a produção de blocos de material orgânico combustivel.  Esses briquetes seriam utilizados em países pobres, de forma a substituir a lenha, tanto para aquecimento de residencias como para o preparo de alimentos. Apesar da sua queima emitir gases à atmosfera, o reaproveitamento dos restos da bananeira impede que novas áreas sejam desmatadas (Rothman, 2009).
Os estudos realizados por Emile Frison, chefe da Rede Internacional para o Aprimoramento da Banana (França) defende a manipulação genética pois prevê uma ameaça à banana e acredita que a mesma poderia ser extinta em 10 anos. O motivo? Falta de diversidade genética para resistir às doenças que atacam as plantações. Curiosamente, “todas as variedades da banana moderna são descendentes de uma banana mutante estéril, cultivada na Idade da Pedra”. Dessa forma, a ação de fungos que já atingem plantações na África, Ásia e nas Américas torna essa fruta vulnerável à extinção. A Doença (ou Mal) de Panamá,consiste em um fungo que se instala no solo e destrói as plantações de bananas. Há 50 anos, essa doença destrui a variedade chamada Gros Michel e no século 19, a variedade de banana descoberta pelos ingleses, a Cavendish, se mostrou resistente à Doença de Panamá, porém, está ameaçada por uma epidemia global, já que o fungo reapareceu na Ásia com outra variação (Jornal da Ciência, 2003; BBC, 2003).


Diante desse contexto, como é possível avaliar o valor da biodiversidade?
 Figura 2: Transporte de bananas na Tanzânia. (Fonte: DufeK, 2011)
Em 1798, Thomas Malthus publicou “Um ensaio sobre o Principio da População”, onde defendeu que a população humana tende a crescer geometricamente enquanto os recursos disponíveis tendem a crescer aritmeticamente. Dessa forma, a população superaria a oferta de alimentos que está disponivel para que a mesma pudesse satisfazer as suas necessidades. Em contraponto aos que consideravam ilimitada a capacidade da humanidade dominar o ambiente, há mais de 200 anos, Maulthus previu que o crescimento da população levaria à degradação da terra e consequentemente, fome, guerra e proliferação de doenças (Bryant, 1997).
 Figura 1: Thomas Malthus. (Fonte: Bleier, n.d.)
De acordo com Bryant (1997), em setembro de 1999 a população daTerra chegou a 6 bilhões de habitantes e a cada segundo, três pessoas são adicionadas no mundo diariamente, somando cerca de 87 milhões de pessoas ao ano. De acordo com Worldometers (2012), em 24 de março de 2013 a população mundial já ultrapassa 7,1 bilhões, onde mais de 902 milhões de pessoas estão subnutridas e aproximadamente 21.400 pessoas morreram por causa da fome. Por outro lado, Bryant (1997) explica que apenas uma pequena porcentagem de plantas são atualmente utilizadas para consumo humano, sendo que 90% dos alimentos vem apenas de espécies de arroz, milho e trigo. Dessa forma, além da população e os recursos crescerem de forma assimétrica, não é conhecido todo o potencial de utilização, seja para nutritição ou não, das milhares de espécies da flora e fauna existentes no mundo.
O aumento da população humana sobre a Terra ocorre de forma desigual, sendo a Africa o continente que mais cresce. Esse rápido crescimento populacional do planeta gera consequencias sociais como baixos padrões de vida, desemprego, fome, guerra civil e a destruição do meio ambiente, especialmente na forma de desmatamento. As pessoas mais ricas tendem a não se sentirem afetadas pela perda dos serviços ecossistemicos porque possuem capacidade (recursos) para adquirir  produtos substitutos ou deslocar as suas produções e colheitas para outras regiões. Por outro lado, os custos e riscos  associados à perda de biodiversidade tendem a aumentar, e a cair de forma desproporcional sobre os pobres  (Millennium, 2005). Por exemplo: o declinio das populações de peixes em uma área reflete diretamente nas comunidades que dependem da pesca, seja como fonte de proteína, seja como fonte de geração de renda.
De acordo com Millennium (2005), as pesquisas sobre os serviços ecossistemicos mostram que “apesar de muitas pessoas se beneficiam das ações e atividades que levam à perda da biodiversidade e mudanças nos ecossistemas, os custos suportados pela sociedade de tais mudanças é muitas vezes maior”, levando algumas pessoas a experimentar um declínio em matéria de bem - estar. Ainda, ressalta que as pessoas pobres, são mais diretamente dependentes da biodiversidade e dos serviços de ecossistemas e por isso, são mais vulneráveis ​​à sua degradação.
Segundo Bryant (1997), “uma das formas de identificar razões para crer em conservação da biodiversidade é olhar para o que derivam da diversidade biológica, e que nós vamos perder como resultado da extinção de espécies.” Por outro lado, muitas pessoas já reconhecem o valor intrínseco da biodiversidade, sendo que isso não pode ser avaliado em termos economicos convencionais. 

“A perda da biodiversidade é importante por si próprio porque a biodiversidade tem valores culturais, porque muitas pessoas atribuem valor intrínseco à biodiversidade, e porque ela representa opções inexploradas para o futuro” (Millennium, 2005).
Referências Bibliográficas
BBC 2003, Banana pode estar extinta em 10 anos, afirma cientista, acessado em 24 de março de 2013, http://www.bbc.co.uk/portuguese/ciencia/030116_bananacb.shtml  
Bleier R n.d., The Home Page of
The International Society of Malthus
, acessado em 24 de março de 2013,
http://desip.igc.org/malthus/ 
Bryant P J 1997, Biodiversity and conservation: a hypertext book. Peter J. Bryant.
Dufek R de G 2011,  "B" "banana" bonanza in Africa, acessado em 24 de março de 2013, http://diverbeck.blogspot.com.br/2011/01/b-banana-bonanza-in-africa.html
Jornal da Ciência 2003, Cientistas prevêem extinção da banana, acessado em 24 de março de 2013, http://www.jornaldaciencia.org.br/Detalhe.jsp?id=7323 
Millennium Ecosystem Assessment 2005, pp. 1-41. In Ecosystems and Human Well-being: Biodiversity Synthesis. World Resources Institute, Washington, D.C.
Rothman P 2009, Banana seria combustível na África, acessado em 24 de março de 2013, http://info.abril.com.br/noticias/tecnologias-verdes/banana-seria-combustivel-na-africa-31102009-7.shl
Toda Fruta n.d., Normas de Classificação - Banana Musa Spp, acessado em 24 de março de 2013, http://www.todafruta.com.br/portal/icNoticiaAberta.asp?idNoticia=14865
Worldometers 2012, População Mundial e Alimentação, acessado em 24 de março de 2013, http://www.worldometers.info/br/
 


 
 

quinta-feira, 21 de março de 2013

Critérios para a Biodiversidade?


Critérios para a Biodiversidade?

Hipoteticamente, em dois ecossistemas localizados em áreas distintas há, em cada um, pelo menos uma espécie ameaçada de extinção, de acordo com o Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção, produzido pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade, vinculado ao Ministério do Meio Ambiente.


 Fonte: Colecionador de Conchas, 2010.

Fonte: Canadian Museum of Nature n.d.
Nome científico: Megalobulimus lopesi
Nome popular: Caracol-gigante-da-boracéia
Status de Ameaça:
Brasil (MMA, IN 03/03): Ameaçada.
(Machado et al, 2008.)
Nome científico: Myrmecophaga tridactyla
Nome popular: Tamanduá-bandeira
Status de Ameaça: Brasil (MMA, IN 03/03): Ameaçada.
 
(Chiarello, 2008)

Caso a conservação da biodiversidade dessas áreas dependesse, entre outras ações, da proteção dessas espécies e fosse possível escolher apenas uma delas para atuar em prol da sua proteção, qual seria escolhido? Que critérios seriam utilizados?
Aprendemos que biodiversidade consiste, basicamente, na “diversidade de vida em uma dada área”, mas não é simples assim.  O conceito de biodiversidade é considerado por alguns autores como sendo de caráter pseudocognitivo, pois sua interpretação varia bastante e de acordo com o grupo que o interpreta. Para os taxonomistas, por exemplo, as espécies não tem o mesmo valor em função do grau de diferenciação entre os organismos, estimado pela utilização da hierarquia da classificação taxonômica que verifica a diversidade genética entre taxa. (Araújo, 1998). 
 
Já o conceito de biodiversidade, para os ecologistas, abrange questões como qualidade do ambiente e processos ecossistêmicos, considerando as espécies chave, as de maior ocorrência e sua função no ecossistema, por exemplo. Ainda, algumas espécies podem ser consideradas mais importantes que outras devido a sua maior ou menor contribuição para a biodiversidade de um ecossistema. (Christie et al, 2006) Mas, e para o público em geral?
 
Um estudo realizado por Christie (et al, 2006) em Cambridgeshire (Inglaterra) e Northumberland (Escócia) apontou resultados interessantes, que constatam diferenças entre os conceitos ecológicos e antropocêntricos, comentados a seguir.
Um dos fatores que dificultam o exercício da valoração da biodiversidade consiste justamente na má compreensão do público sobre este conceito, tornando necessária a utilização de linguagem apropriada e utilização de recursos audiovisuais para facilitar o entendimento.

Os critérios do publico não são considerados ecologicamente importantes para a conservação da biodiversidade, pois estão associados, especialmente, aos benefícios diretos que podem trazer para o publico, como por exemplo, os insumos para a indústria farmacêutica e os serviços ecossistêmicos que exercem impacto direto sobre os seres humanos e o seu bem-estar. Ainda, o carisma, a importância local e a familiaridade que o publico tem com as espécies, são outros critérios fortemente levados em consideração.
 
Entre os resultados da pesquisa, constatou-se que a há preocupação com o incremento da biodiversidade, mas não em como esse incremento pode ser alcançado. Neste sentido, grande parte dos entrevistados mostrou-se disposta a pagar taxas e impostos para essas melhorias e alguns poucos defendem que os valores devem ser pagos apenas por aqueles que degradam o meio ambiente.
 
Porém, um dos resultados mais interessantes é que o público entrevistado se mostrou disposto a apoiar as políticas que visam a recriação de ecossistemas e a recuperação de espécies raras, ao invés de apoiarem as políticas que objetivem retardar o tempo que leva para que espécies sejam localmente extintas, desacelerando o seu declínio. Tal postura pode ser fundamentada pelo principio da aversão à perda, onde as perdas são mais valorizadas que os ganhos, de acordo com Kahneman (et al 1991 apud Christie et al, 2006).


Referências Bibliográficas

Araújo M 1998, Avaliação da biodiversidade em conservação, Silva Lusitana, vol. 6, n°1, pp.19-40.

Canadian Museum of Nature n.d., Mammals – Giant Anteater, acessado em 20 de março de 2013, http://nature.ca/notebooks/english/giantant_p7.htm

Chiarello A G, Aguiar A M S, Cerqueira R, Melo, F R, Rodrigues F H G, Silva V M F 2008, ‘Mamíferos’, in Angelo Barbosa Monteiro Machado, Gláucia Moreira Drummond & Adriano Pereira Paglia (eds) Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção, vol. 2, 1 ed., MMA, Brasilia.

Christie M, Hanley N, Warren J, Murfy K, Wright R & Hyde T 2006, Valuing the diversity of biodiversity, Ecological Economics, vol. 58, pp. 304– 317 

Colecionador de Conchas 2010, Megalobulimus lopesi, acessado em 20 de março de 2013, http://colecionadordeconchas.blogspot.com.br/2010/12/megalobulimus-lopesi.html

Machado A B M, Brescovit A D, Mielke O H, Casagrande M, Silveira F A, Ohlweiler F P, Zeppelini D, De Maria M & Wielovh A H 2008, ‘Invertebrados Terrestres’, in Angelo Barbosa Monteiro Machado, Gláucia Moreira Drummond & Adriano Pereira Paglia (eds) Livro Vermelho da Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção, vol. 1, 1° ed., MMA, Brasilia.